É um conto de cariz moralista, este, adaptado pela escritora Jeanne-Marie Leprince de Beaumont de uma versão negra e sexualizada da conhecida Madame Villeneuve. Um conto sobre aparências e riquezas interiores que ultrapassou gerações e que encontrou no cinema um certo e confortável lar. A mais emblemáticas das transições cinematográficas ocorreu em 1946, num poético filme de Jean Cocteau, na linha do existencialismo animalesco de um dos seus protagonistas em constante confrontação com o afecto, o amor no seu estado mais platónico.
Depois da feliz experiência, uma metragem gótica que consolidava o melhor de dois mundos (o cinema sonoro e o mudo), aconteceram enésimas adaptações, grande parte delas fora do estatuto do memorável. Em 1991, a Disney, determinada a sair das ruas de amargura que frequentava, lança-se numa animação tecnicamente gloriosa, assim como musicalmente cativante para um vasto leque de audiências. Hoje tido como uma das melhores produções da casa do Rato Mickey, é então que aparece entre nós … isto.
Temos efeitos visuais, cenários grandiosamente artificiais, um elenco que está ali para cumprir o cheque (só Luke Evans parece funcionar num filme com grandes erros de casting, de onde não se livre sequer Emma Watson) e, claro, zero em criatividade. Este novo A Bela e o Monstro chega quase a ser um frame-to-frame da amada animação, um declarado “remake” espalhafatoso que demonstra o quanto o estúdio está empenhado em manter o seu rigor mortis de conformismos mercantis.
Pelo vistos, parece ser tendência para aqueles lados. Já com Cinderela e O Livro da Selva se assistiu a essa avarenta apropriação do legado e, como tal, o resultado parece somente o lisonjear um património, em vez de construir novas narrativas para gerações futuras. Não seria mais fácil relançar o clássico do que gastar “rios de dinheiro” numa obra copista? Nostalgia ou não, a verdade é que tudo é fruto de uma indústria que se contenta com o mesmo espectáculo de sempre, onde os atributos técnicos do costume prevalecem frente à arte de contar uma História. Mas as pessoas vão adorar? Claro que vão, faz tudo parte de uma experiência de recordações, mas o que vemos é um filme de 1991, não uma sofisticação de 2017. Duas horas divididas entre o completamente vazio e a palha desnecessária.