Domingo, Outubro 13, 2024
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Suspiria: De Disney a Lynch, o pesadelo continua a passar por aqui…

Há filmes que perdem o seu fulgor com o tempo, mas existem outros que, em vez disso, adquirem renovado entusiasmo e refinada patine muito para além do fenómeno de culto. Suspiria, a obra mais prima de Dario Argento, é disso perfeito exemplo, convertendo-a numa soberana oportunidade de descoberta ou reencontro, agora na luxuosa cópia em 4K, como parte do programa Amarcord da 10ª Festa do Cinema Italiano.

Ao longo deste percurso frenético e garrido, enquadrado como uma variante escarlate dos tijolos que conduzem a Oz, somos assaltados pelo esoterismo dos demónios e bruxas que atormentaram as donzelas da Disney, embora a abrir uma inesperada correspondência com as diversas Lauras Palmers de David Lynch (mesmo em versão Mulholland Drive), também elas embrenhadas em pesadelos profundos e garridos.

Suspiria é uma espécie de clássico da veia pré-punk que assaltou o cinema dos 70’s, desde logo sublimado pelas escaldantes óperas rock, como O Fantasma do Paraíso e Rocky Horror Picture Show, de 74 e 75, aqui devidamente pontuado pela música demoníaca da banda italiana Goblin (que já havia participado em Profondo Rosso, ou O Mistério da Casa Assombrada).

Razões não faltam para um mergulho no ambiente escarlate e fantasmagórico do castelo encantado, disfarçado de escola de dança, em que Suzy Bannion viverá um dos maiores pesadelos de horror adensado pelo esoterismo e mitologia de bruxas e demónios interiores.

A rapariguinha é Jessica Harper, cuja ingenuidade gritante fora descoberta em O Fantasma do Paraíso (1974), de Brian De Palma, e recuperada por Argento para recriar o seu mais belo giallo, os tais filmes inspirados nos contos sórdidos imprimidos em paper amarelo (giallo é amarelo em italiano) de baixa qualidade. Aí se encontra com uma dupla de bruxas arrepiantes e glaciais: uma é Allida Valli, outrora apelidada “next Garbo” e a dama de Senso, de Visconti; a outra é Joan Bennet, a atrevida Kitty que tenta Edward G. Robinson, em Scarlet Street.

Na altura, a promoção do filme vendeu a ideia de que mais arrepiastes que os cinco minutos finais, eram apenas os anteriores 90. Por aí se engendram alguns dos assassínios mais macabros registados em película, desafiando Alan Poe ou o Marques de Sade e cujo efeito visual foi ficado por uma velha película em Tecnhicolor de baixo contraste, combinada com filtros coloridos, ajudou Argento a conseguir essa saturação da cor. Um excesso cromático que é hoje suportado de uma forma bem mais intensa e precisa com a qualidade do ultra HD 4K, que torna o efeito de pesadelo ainda mais ampliado graças à equalização da banda sonora.

É claro que Suspiria funciona mais como um objeto de composição visual e cromática, até porque nem sequer esta narrativa muito giallo pretende assumir grande protagonismo, pelo menos não da forma que nos habituou Hitchcock, de quem Dario assume justificada influência. Mas mesmo nesta clara supremacia da forma sobre o conteúdo ficamos menos rendidos no efeito do género.

Ficamos agora à espera do que fará Luca Guadagnino com a sua anunciada versão de Suspiria – aparentemente não será um remake – ele que já nos deu um dos grandes filmes deste ano em Berlim – Call Me By Your Name.

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