Linhas de Sangue parece ter sido concebido num laboratório, como o tal projeto em que se injeta tudo aquilo que se supõe ter faltado para que o cinema português seja o sucesso comerical que não tem sido. Ou seja, algo espevitado e visualmente deslumbrante, devidamente servido por uma narrativa audaz, vá picante mesmo, cheia de non sense e caralhadas à descrição. Já agora, ainda servido por uma lista interminável de nomes ou caras mais ou menos conhecidas da televisão, devidamente arrumadas para caberem no cartaz do filme.
Pois é, e o que temos? Bom, esta geringonça de díficil classificação, provavelmente urdida com as melhores intenções por Manuel Pureza e Sérgio Graciano, mas por não ter nem rei nem roque (leia-se produção, enfim alguém que tome conta da coisa) não passa afinal de contas de um frankenstein tripado, armado ao pingarelho e arraçado do seu inevitável DNA televisivo em que cada gag vem antecipado por um comando para a gargalhada. Nas salas, sabe-se agora, haverá comando para escolher o final. Enfim, como isso salvasse o que não tem remédio. Ou seja, ficamos com uma trapalhada pegada, embora com muita vontade de ser aquilo que não é, um Robert Rodriguez passado dos carretos. Pois é, temos pena.
O problema é que se calhar até podia ser, não fosse esse desnorte pegado, essa ambição dispersa num guião de esboços – serão essas as tais linhas de sangue? – inevitavelmente refletido numa amalgama de planos ou pedaços de sequências que nunca chegam a fazer sentido.
Tudo começa com uma imagem aérea captada por um drone que sobrevoa o Parque das Nações com uma legenda geográfica disparatada mas que logo justifica que era apenas uma graçola, isto no caso de não temos percebido. E por aqui seguimos uma proto-história que combina terror, uma ameaça de golpe militar palaciano de destruir a ponte 25 de Abril, mas que depois é esquecida. Pelo meio teremos até personagens inspiradas em videogames, como Catarina Furtado, de longe a mais interessante do filme, bastante convincente como uma variante de Lara Croft.
Pena é perceber que se desbarataram recursos para tão fraco resultado, e se minou um terreno que até poderia dar outros frutos. Espera, não é que o press do filme até sugere novos capítulos “para esta saga tão inédita quanto absurda”? Pois é, a curiosidade é tramada e sempre deu os seus frutos. Pelo menos na televisão. Ou no youtube, bastando para isso dar 30 segundos a um famoso que depois fará a habitual autopromoção no seu canal. Tudo certo, mas não é por aí que se poderá aferir alguma ilação sobre a tal fórmula que levará multidões às salas de cinema. Só talvez para aquele desbunde ou fruição mais ou menos alarve partilhada por amigalhaços que aceita a permissa de se deixar levar pelos destinos insondáveis de um filme-geringonça.