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O Paraíso, Provavelmente: Elia Suleiman perto do céu faz-nos navegar pela “palestinização” do mundo

Afinal de contas talvez o céu possa esperar, como se escuta no filme. Elia Sulieman viaja da Narazé a Paris, e daqui para os Estados Unidos, mas apenas para ficar mais baralhado com o ritmo do mundo. O Paraíso, Provavelmente foi um dos filmes em competição para a Palma de Ouro em 2019. Venceria o prémio FIPRESCI. Finalmente, pode ser visto nas nossas salas.

(artigo publicado a 25 de junho de 2019, agora com outra edição)

O realizador palestino criou um espaço autónomo para o seu cinema. Algo que faz apenas quando sente em absoluto essa necessidade. O último foi O Tempo Que Resta, há precisamente dez anos, apesar do interregno com a participação de um episódio no projeto conjunto 7 Dias em Havana. Para além disso, as suas narrativas dificilmente integram géneros pre-definidos.

O Paraíso, Provavelmente mostra de novo a ironia plácida do próprio Suleiman, qual observador atónito silencioso que regista mas não atua, embora esse silêncio seja bem expressivo no seu significado. A sua interpretação reduz-se a duas brevíssimas frases que dizem basicamente o mesmo: “Sou da Nazaré” e “Sou Palestino”. Ou seja, sublinha a sua identidade, mas para nos levar naquilo que pode ser um a”palestinização” do mundo. Desde logo porque este é também o filme em que Elia sai pela primeira vez da Palestina (isto sem contar com 7 Dias em Havana, de certa forma um ensaio para este filme).

Tudo começa começa da forma mais desconcertante, na reconstituição de uma oração cristã em que supostamente se abrem as portas do céu. Só que lá de dentro dizem que não as irão abrir. Algo de burlesco acontece e sublinha o tom do filme. É claro que parte da especificidade de Elia Suleiman passa pelo papel que o próprio assume, normalmente associado a um certo cliché que o aproxima de Jacques Tati e Buster Keaton, embora seja algo que o próprio rejeita, manifestando até maior gosto pelo cinema de Tsai-Ming Liang, mas também Roy Anderson ou Hou Hsiao-Hsien, além dos mestres e iniciais inspiradores, Ozu e Bresson.

Em diferentes momentos, assistimos a essa alienação e à procura de outros espaços. Desde logo na sua chegada a Paris, onde primeiro se sente subjugado às coreografias da moda e aos rituais da segurança; ao passar pelas terras do Tio Sam, é o uso de armas que é caricaturizado ao extremo, em situações a roçar o grotesco, e em que a presença de um palestino num táxi é motivo de celebração do motorista árabe; mas também alguns contornos da própria energia da militância palestina. Contudo, um dos episódios mais caricatos neste périplo sucede na visita que Suleiman faz à sua produtora em Paris para a promoção do projeto O Paraíso, Provavelmente, embora para levar um a”tampa” do seu atual produtor, Vincent Maraval, da Wild Bunch, por entender que a ideia não deverá funcionar por se tratar da ideia obscura de “uma comédia sobre a paz no Médio Oriente”. Sobre esse tema, aparentemente insolúvel – será a tal entrada no céu? – apenas se dirá mais adiante que não será para esta ou a próxima geração.

Ainda assim, mais do que se embarcar em qualquer ativismo ou sugerir soluções para os problemas intermináveis, Elia Suleiman limita-se apenas a lançar interrogações com o seu sobrolho de espanto, incredulidade ou intriga. Talvez por perceber que esses problemas são, afinal de contas, comuns a outros países que não supunham tê-los. Ao inverter os dados do imbróglio da globalização, sugere talvez uma descompressão poética da tensão como forma de se poder enxergar melhor. Quem sabe, daí poder abrir as portas do céu.

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