Há uma lição de determinação nacional e firmeza política que se pode tirar do extenso e detalhado documentário que o ucraniano Sergei Loznitsa faz do processo de luta pela independência da Lituânia, entre 1988 e 1991. E que inevitavelmente se liga ao processo da actual invasão da Ucrânia. Desde logo por serem ambos os casos visados pelo mesmo regime soviético. É isto Mr. Landsbergis, 248 minutos de imagens de arquivo que passam a correr… Passa este sábado, dia 8, no DocLisboa, em sessão única (16.45 São Jorge – sala 3).
Mesmo sem adoptar o formato de documentário biográfico, é na pessoa, na personalidade e no percurso político de Vytautas Landsbergis, o fundador do partido pró-idependentista, e figura à frente do Parlamento lituano depois da separação oficial da U.R.S.S. que assenta este muito relevante documentário que acrescenta densidade à filmografia de Sergei Loznitsa. Isto já depois de termos conhecido Babi Yar Context (2021), em Cannes 2021, um documento sobre o massacre de 33,731 judeus na ravina a norte de Kiev. Dele aguardamos também The Natural History os Destruction (2022), bem como o recentíssimo The Kiev Trial, igualmente deste ano, sobre os crimes de guerra cometidos na Ucrânia em 1946.
O corpo base de Mr. Landsbergis é a extensa entrevista que Vytautas dá a Loznitsa, sentado no jardim da sua casa, servindo de guia aos diferentes passos históricos vividos três décadas antes e devidamente acompanhados de diversos registos de arquivo.
Era que ele professor de música quando se sentiu forçado a tomar parte do destino da nação e a esperança de liberdade, sobretudo depois de sentir o ‘vento da mudança’ operado pela perestroika de Mikhail Gorbachev no final de década de 80. É todo esse espaço que se revive: entre as manifestações em Vilnius e em todo o país contra a ocupação soviética, passando por debates no Parlamento Lituano, bem como pelo congresso soviético, sobretudo quando Gorbachov percebe os riscos de aceitar essa pretensão de libertária, que oscila Mr, Landsbergis. Isto até à declaração de independência em 1990, a que se seguiu a demonstração de força, agressão e bloqueio económico.
Socorrendo-se de uma extensa panóplia de registos, Loznitsa (de referir que Vytautas Landsbergis, o filho, co-assina o guia com Sergei) e o seu editor Danielius Kokanauskis tecem um tremendo registo do ataque russo à estação de televisão, mas também sobre a população, causando diversas vítimas civis, em ações geridas de forma deficiente e errática por um Gorbachov determinado a manter intacta a sua união de repúblicas. Se nestas imagens sentirmos algum elemento de déjà vu é porque a História tem tendência e repetir-se. Tanto na opressão, como na sua libertação.
Curioso é verificar como este drama político facilita uma visão muito mais correcta da habitual postura de ‘nobre’ estadista com que habitualmente Gorbachev tem sido mostrado. Seguramente, em contraste com o tratamento, esse sim, o ‘nobre’ de Mr. Landsbergis. Um nome para a História que é necessário recuperar.