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My Stolen Planet e No Other Land: o cinema de causas vence a 10ª edição do MDOC

My Stolen Planet

Gradualmente, o Festival Internacional de Documentário de Melgaço tornou-se num evento incontornável do cinema documental. De Portugal, bem entendido, mas não só, pois dificilmente seria possível ignorar a qualidade do cinema apresentado de 29 de julho a 4 de agosto, na vila raiana de Melgaço, bem como o tremendo convívio internacional gerado pelos muitos cineastas presentes. 

Sim, foi o cinema de causas o grande vencedor da 10ª edição do MDOC. Desde logo pela abordagem a que o cinema do real faz a temas ‘quentes’ da atualidade, fazendo-nos acreditar no potencial das causas. Seja a defesa dos direitos humanos (ou a falta deles), por exemplo, na sociedade patriarcal no Irão, ou o tremendo realismo e injustiça questão palestiniana, à qual se aliam os fluxos migratórios, questões coloniais, ambientais ou de género. Todas elas presentes nos 31 filmes a concurso na seleção oficial do MDOC, entre 21 longas e 10 curtas ou médias metragens.

Dois filmes defenderam bem as suas causas, apostados num cinema feito ato de resistência. De um lado, o ensaio em forma de auto-documentário formado por memórias de arquivo, em My Stolen Planet, da iraniana Farahnaz Sharifi, uma cineasta nascida em 1979, apenas três semanas depois da revolução islâmica, devidamente galardoado com o Prémio Jean-Loup Passek, correspondente à Melhor Longa-Metragem Internacional. Fascinante a forma como descreve a sua batalha entre a memória e o esquecimento, entres dois mundos diferentes, o da sua família numerosa onde não se quer deixar de dançar e sorrir, e outro, lá fora, marcado pelo cancelamento feminino, vedado por um pedaço de pano, o hijab. 

No Other Land, Menção Especial

O outro filme foi merecedor de uma Menção Especial. Trata-se de No Other Land, do coletivo ativista formado por dois palestinianos Basel Adra e Hamdan Ballal, e dois israelitas Yuval Abraham e Rachel Szor, registando a realidade da comunidade Masafer Yatta que se vê impiedosamente desprovida da sua casa, bens e terra, pelas forças israelitas que decidem construir na sua terra uma base militar, como forma de afastar o povo palestiniano e assim abrir espaço a novos colonatos judaicos. Também aqui se sente essa necessidade do registo de imagens, também com o telemóvel, tal como a iraniana Farahnaz. Curiosamente, ambos documentários que tiveram a sua estreia mundial no passado festival de Berlim.

No segmento de curta ou média-metragem, o escolhido pelo júri foi Les Chenilles, de Michelle e Noel Keserwany, aflorando uma história que combina elementos de colonialismo franco-libanês, nomeadamente, na rota da seda, mas igualmente questões de género, exploração e solidariedade feminina. Um filme que surpreende pela forma como tece todos estes temas. Foi o vencedor da Berlinale Shorts e candidato aos Prémios do Cinema Europeu de 2023.

Tão pequeninas, tinham o ar de serem já crescidas, vence Melhor Documentário Português

Tânia Dinis venceria o prémio para melhor documentário português com a memória do olhar, em Tão pequeninas, tinham o ar de serem já crescidas, um filme já premiado no IndieLisboa. A cineasta combina com eficácia o documento com um elemento ficcional, prestando homenagem às mulheres vindas da província de Trás-os-Montes, Baixo Minho e Beira e que durante várias décadas (entre os anos 40 e 70) serviram em casas de família no Porto. Uma vez mais é o arquivo, não só fotográfico, mas também de imagens reais e depoimentos orais, que serve de suporte à narrativa.

O novo documentário de Paulo CarneiroA Savana e a Montanha, apresentado em estreia nacional no MDOC, depois de passagem pela Quinzena dos Cineastas no Festival de Cannes, ganhou ainda uma Menção Especial, no relato da luta contra o povo de Covas de Barroso contra a construção de uma mina de lítio a céu aberto. Uma vez mais, o cinema como ato de resistência. 

Refere a organização do MDOC que esta edição teve um número recorde de realizadores e produtores presentes, 22 ao todo, e uma média de afluência de público na ordem dos 3800 espectadores.

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