Saoirse (lê-se Ser-cha), aí está um nome invulgar! Se não estou em erro, a origem da palavra está relacionada com liberdade, certo?
É verdade. É um nome irlandês. Acho até que é bastante moderno…
No entanto invulgar…
Sem dúvida. Mesmo para a Irlanda. Acho que foi inspirado num livro de crianças.
Acredita que essa expressão será até um moto na sua vida, na sua carreira?
Sim, por acaso, acho que reflecte a minha personalidade, a minha profissão, a minha vida.
Como foi que se relacionou com este projecto? Tinha lido o livro?
Por acaso não, apenas tinha ouvido falar nele através do meu agente. Entretanto gravei umas cenas que enviei ao Peter Jackson. Esperei para ler o livro depois de terminar o filme.
E porquê?
Eu tinha treze anos na altura, e disseram-me que era nova demais para ler aquele primeiro capítulo… É, de facto, algo muito profundo. Por isso não quis adiantar-me. Por outro lado, quis apenas concentrar-me no guião e não na história.
A sua prestação é sempre muito forte, mas a cena na gruta com o Stanley Tucci é mesmo profunda e emocionalmente perturbadora. Como foi que se preparou para mostrar essa vulnerabilidade? O Peter ajudou-a de alguma forma?
Um pouco.
O que estava a pensar na altura em que está a sós com o mostro?
Bom, o guião era uma óptima referencia. Está lá tudo. Mas se eu tivesse alguma dúvida, poderia ir ter com o Pete, a Fran (Walsh, argumentista e companheira de Peter Jackson) ou Philippa Boyens (argumentista). Aliás, era uma personagem que eu deveria ir descobrindo à medida que avançava na rodagem. No início, nem sequer a compreendida bem, nem sabia muito bem quem ela era. Sobretudo porque transforma-se muito ao longo do filme. Eu necessitava de reconhecer isso e saber quando aconteceria. Podemos ter alguém que nos ajuda, mas temos de ser nós próprios a compreendê-la. Foi óptimo trabalhar com o Pete, porque ele foi sempre muito envolvente e mostrava-me sempre como agir.
Deu-lhe também algumas dicas do ponto de vista psicológico?
Na verdade, nada que eu me lembre. Como disse, estava tudo no guião. É claro que tivemos algumas discussões sobre a personagem. Mas era no próprio dia, pois nem sequer ensaiamos muito. Ele tinha sempre uma ideia muito clara sobre como a cena se iria desenrolar.
A Saoirse fez alguma pesquisa ou falou com algumas raparigas que tivessem sido molestadas?
Na verdade, não. Mas acho que isso tema ver com a Susie (Salmon, a personagem), pois ela tem sempre um espírito muito aberto e não aceita durante muito tempo o facto de que está morta. Acho que é por isso que ela é diferente. Digamos que tive uma boa instrução por parte do Pete e de toda a equipa. Mas, na verdade, não fiz muita pesquisa… Acho que a música ajuda imenso, por exemplo.
E o que estava a ouvir quando preparava essa cena?
Era sobretudo música dos anos 70, que é quando se passa esta história. Brian Eno e outros artistas que escolheram para fazer a banda sonora. Ouvia também muita música clássica.
Como é que respondeu aos rumores de que teria neste filme uma das interpretações do ano e que poderia inclusive ser uma das nomeadas para o Óscar? Sentiu que isso lhe provocou uma pressão suplementar?
Quando me trouxeram a notícia, apenas engoli em seco. Tentei sempre não pensar muito nisso. É bom que as pessoas me vejam com essa exposição. É seguramente o melhor lugar para estar e a melhor reacção que podemos esperar da nossa performance. O importante é que gostem do filme.
Mesmo assim não seria a primeira vez que tal sucedia, pois foi nomeada por ‘Expiação’. Como descreveria essa sensação de ser nomeada pela primeira vez?
Por acaso, nessa altura estava eu na Nova Zelândia a filmar ‘Visto do Céu’. Por isso, foi uma notícia que nos chegou mesmo de madrugada. Lembro-me que os meus pais ficaram histéricos, enquanto que eu fiquei em choque. Foi mesmo algo totalmente inesperado. Eu nem queria acreditar que iria mesmo à cerimónia dos Óscares, um espectáculo que sigo há muitos anos na TV. Tive também muitos conselhos de pessoas que sabem o que é estar nos Óscares. Como o Peter Jackson que já ganhou imensos Óscares!… (risos).
Consegue encontrar algum ponto de contacto entre Susie e Briony (a personagem de ‘Expiação’)?
Bom, uma coisa eu me posso relacionar: é que são ambas raparigas criativas e têm ambas uma grande imaginação.
Percebo que é algo com que se relaciona bem…
Sim, sim. Eu imagino coisas a toda a hora. Estou constantemente a criar coisas na minha cabeça. A Briony é muito esse tipo. Quando à Susie vemos apenas a sua imaginação quando ela está no seu mundo “de passagem”.
Quando observava o trabalho de actor do seu pai também imaginava coisas. Por exemplo, que poderia um dia ser também actriz?
Antes de começar mesmo a representar não, acho que não. Eu era muito nova na altura. Teria uns sete anos.
No entanto, poderão existir muitos jovens que ; ao vê-la no ecrã, poderão pensar se não poderá um dia chegar a vez deles. Que conselho lhes diria, se pudesse?
Acho que é importante ter algum envolvimento com o teatro. Eu tive muita sorte na minha escola, pois todos os anos fazíamos um teatro. E todos nós tínhamos direito a interpretar dois papeis, pois éramos muito poucos. Eu sempre queria fazer dois papéis. Outra coisa que podem fazer é um pequeno filme com os amigos. Eu adorava fazer isso, é muito divertido. Sobretudo porque não é nada sério. É apenas uma possibilidade de libertar a nossa imaginação e levá-la ao ecrã na TV. E depois ver bons filmes e não filmes de fraca qualidade. Quer dizer, sempre podemos ver os mais beras, mas deveremos prestar mais atenção aos de qualidade.
A Saoirse já teve a oportunidade de trabalhar com grandes actrizes, como a Keira Knightley, Vanessa Redgrave, mas também a Rachel Weisz ou a Susan Sarandon. Está preparada para ser uma delas quando foi mais madura? Por outras palavras, como é que se encara num futuro não muito distante?
Uuuhh…. Não sei.
Pelo menos, sabe que é esse o seu caminho. E isso já ajuda, não?
Sem dúvida. Quero ser uma boa actriz. Não é que não me interesse ser uma estrela de cinema, mas o lado da fama e dos paparazzi é algo que não me interessa tanto. Se com essa exposição vierem também bons papéis e que as pessoas gostem do que eu faço, então acho que será óptimo.
Com todo este trabalho que tem, encontra ainda algum tempo para estar com a família?
Bom, os meus pais acompanham-me para todo o lado, o que é óptimo. Mas é sempre algo surreal estar diante de 20 fotógrafos aos gritos. Isso não é natural. Por isso acho que nunca ficaria muito confortável. Todo o resto vem com o trabalho. Gosto de me vestir, mas não gostaria que me perseguissem com uma câmara.
No meio de tanta agitação é difícil manter os pés no chão?
Não é assim tão difícil, pois tenho muita gente genuína perto de mim o tempo todo. É útil ter essa roda de amigos num meio que, por vezes, pode esconder os seus perigos. Se não estivermos conscientes do que significa a fama, então é melhor não ir por aí.
Já sabe o que vai fazer a seguir?
Sim, vou começar um novo projecto, mas não posso ainda falar nele.
Compreendo. Foi um prazer falar consigo. Boa sorte para o futuro.
Obrigada.
O QUE ESTÁ A FAZER
(publicado na revista Máxima edição de Maio)