Ao longo da sua carreira, Gaspar Noé tem-nos arualizado com um reflexo de excessos que sao bem mais próximos de nós do que pensamos. E, porque não até, a porposta de uma reflexão de questões essenciais da vida (e da morte). Aqui parece fazer um cocktail de tudo, bem agitado e servido como se fosse um batido energético. Preparados para a nova loucura de Gaspar Noé? Nunca estamos, port isso aderimos a ela.
Foi no passaso festival de Cannes que chegámos ao Climax. E diga-se que o realizador francês nascido na Argentina já é um verdadeiro filho de Cannes. Um filho maldito, extremo diga-se, porque o seu cinema excessivo também nunca foi muito bem digerido por parte da imprensa internacional. Recordamos, de resto, a primeira (e mítica) sessão de imprensa de Irreversível, em Cannes 2002, repleta de uma multidão ansiosa para ver a cenas de sexo entre Vincent Cassel e Monica Bellucci, mas que gradualmente foi abandonando a sala; tal como a de Enter the Void, sete anos depois, com uma receção semelhante, e a culminar em 2015, com o apupo ao sexo explícito em 3D, de Love.
Talvez por isso, se compreenda o press kit em formato de cartaz, citando os diferentes filmes, com o adjetivo negativo, e em baixo, Climax, com a sugestão agora provem este! E este é um cocktail perigoso à base de sangria, mas com um cheirinho de LSD. Aliás, o filme, que se diz inspirado em factos reais, e assinalado com a data de 1996, pode até ser visto como um mix festivo e revisionista da obra anterior, justificado por uma festa do final do estágio de um grupo de dança isolado num armazém algures numa região florestal.
Esses bailarinos – onde se inclui, por exemplo, Sofia Boutella que vimos também em Cannes em Farenheit 451, o desnecessário remake do original de Ray Bradbury, adaptado por Truffaut em 1966 – estiveram na sessão oficial deste título da Quinzena dos Realizadores, e levaram a festa para o palco assim que acabou o filme, contagiando o público que seguiu a sessão e que acompanhou todo o início com aplausos acalorados (como se vê no vídeo que fizemos).
Sim, a temperatura foi mesmo ao rubro, a contrastar, lá fora, com o branco da neve. E o sinal dessa mescla foi-nos logo dado no pré-genérico em que vemos uma mulher nua e ensanguentada, em pranto, a correr e rastejar na neve.
A verdade é que Noé sabe aguçar-nos a curiosidade e o libido, com este cinema em transe, feito de longos planos sequência subjetivos destinados a oferecer novos limites. O que começa com um casting vídeo, num monitor rodeado de cassetes VHS com diversos títulos, de Suspiria, o clássico de horror de Dario Argento, a 120 Dias de Sodoma, de Pasolini, Un Chien Andalou, de Buñuel, etc, evolui na sua primeira parte para uma trip psicótica em que essa energia, ritmo e movimentos são substituídos pelo abismo e pesadelo. Enfim, os tais filmes no início não eram meras sugestões ocasionais.
Mesmo sem ser um grande filme, Climax acrescenta aos anteriores mais uma experiência de profundo êxtase, o que mais não é, afinal de contas, a forma como Noé observa o nosso mundo.
(artigo publicado durante a cobertura do Festival de Cannes 2018)