A exibição da cópia restaurada da primeira parte de Napoléon (de 3h40), o épico histórico realizado por Abel Gance, em 1927, programado para a abertura da secção Cannes Classics, no próximo dia 14 de maio, constitui, por si só, um dos eventos mais marcantes da 77ª edição do festival de Cannes, que contará com a presença de Costa-Gavras, o presidente da Cinemateca Francesa, e de Frédéric Bonnaud, o diretor geral. Um momento histórico a funcionar como chamada de atenção para a robusta programação dos 20 anos de Cannes Classics, uma secção este ano constituída por diversas efemérides comemorativas, documentários evocando a história do cinema e da cinefilia, além, naturalmente, de um conjunto muito significativo de cópias restauradas.
Bem andou Thierry Frémaux, o diretor artístico do festival mais importante do mundo, ele que também é diretor do Festival Lumière, dedicado ao cinema de património, em aproximar estes dois eventos maiores do cinema. E que terá a celebração do regresso de Wim Wenders à Croisette, desta vez para celebrar os 40 anos da Palma de Ouro a Paris Texas, que será exibido em nova cópia digital restaurada.
Diante do ouro cinematográfico desta verdadeiro Seleção Oficial da cinefilia, haverá muito para escolher e fazer até um festival alternativo. Desde logo, o derradeiro gesto de cinema de Godard, concretizado em Scénarios, o filme dos derradeiros 18 minutos que JLG dirigiu na véspera da sua morte voluntária. A sessão será acompanhada pelos 34 min que levaram a esse seu ‘fin du cinéma’. Há ainda a cópia restaurada em 4K, Gilda, o filme de Charles Vidor, realizado em 1946, integrado na celebração do centenário dos estúdios Columbia, bem como o documentário da série Le siècle de Costa-Gavras, dedicada ao filme, A Confissão, de 1971, os 70 anos de Os Sete Samurais, de Akira Kurosawa, de 1954, ou Law and Order, de Frederick Wiseman (que estará em presença), um filme de 1969 que antecipa diversas retrospetivas da sua obra previstas para o outono.
Outro dos destaques da secção Cannes Classics é o filme de Carlos Diegues, o clássico de 1970, Bye Bye Brasil, além da comemoração dos 60 anos (e da Palma de Ouro) de Os Guarda-Chuvas de Cherbourg, de Jacques Demy, ou da exibição de Le Année Déclic, de Raymond Depardon, de 1984. Há ainda o documentário sobre François Truffaut, Le Scénario de ma Via, já bastante debilitado pela doença que haveria de o vitimar, mas com a intenção de escrever a sua autobiografia.
Nesta robusta programação, há ainda a considerar diversos filme que surgem em restauros digitais, como por exemplo, o segundo filme de Steven Spielberg, The Sugarland Express, de 1972, o meio século de Camp de Thiaroye, de Ousmane Sembene, ou Quatre Nuits d’un Rêveur, realizado por Robert Bresson, em 1971, entre muitos outros filme que constituem esta festa da cinefilia em Cannes.