A Ciambra é um dos grandes filmes em competição no LEFFEST. Falámos com o realizador em julho passado no festival de Karlovy vary, que reproduzimos aqui.
Como foi parar a A Ciambra, esta região que dá o nome ao seu filme?
Eu vivo nessa cidade. Mudei-me para lá em 2011 para fazer uma curta chamada A Chjàna, a versão curta do que viria a ser Mediterrânea, o que filme que trouxe aqui há dois anos. Acontece que durante a rodagem o nosso carro foi roubado. Eu até conheço um bem o ambiente dos ciganos e quando um amigo meu me disse que teria de ir falar com eles. Quando fui a esse bairro passei-me! Essa foi a minha primeira interação com esse lugar. Aqui estava um grupo de pessoas que vivi na margem da cidade, isto numa altura em que eu próprio estava a focar também fascinado por o que se passava ali.
Foi então aí que conheceu o Pio?
Ele diz que foi aí que o conheci. Na versão dele, lembra-se que o conheci quando quis recuperar o meu carro.
E qual é a sua versão?
Eu não me lembro dele, porque basicamente estávamos a fazer uma curta. E todo o nosso equipamento estava no carro. Levaram-nos tudo, por isso não pude filmar. Estava mais preocupado em recuperar o material para podermos filmar do que o que se estava realmente a passar. Lembro-me de o conhecer depois.
Agora que idade tem o Pio?
Tem 15 anos. Portanto na altura tinha 10 anos.
Pode dizer-se que esta até tem para si e para ele uma espécie de viagem, já que participou nos seus últimos três filmes?
De certa forma, sim. Conheço entre os seus 10 a 15 anos, uma altura crucial para um rapaz. Dentro desse período estivemos muito tempo juntos. Ele está sempre em minha casa ou eu a jantar em casa dele. Temos uma relação muito familiar.
Como foi que trabalhou com a família Amato para conseguir esse ambiente fluído, que quase parece documental?
Basicamente, quando estou a escrever um filme tenho basicamente um esqueleto, certo? Sei qual é a sua estrutura. O que faço é passar muito tempo com eles e nessa altura escrevo cenas que acabo por incluir no filme. Por exemplo, a cena do jantar. Eu sabia que teria de existir essa cena e em que iriam expressar a sua opinião sobre a comunidade africana.
Fala na comunidade africana, que parecem ser os novos “ciganos” depois desta vaga de emigração. O Jonas que também tem sangue africano como vê essa ligação, essa dinâmica entre estas comunidades que não se misturam muito?
Isso é o que me interessa mais. É claro que pretendo que este filme seja muito fiel ao que se passa com a família de Pio, mas enquanto cineasta há algo que me interessa muito explorar. E é a relação entre Pio e Ayva, porque é um tempo muito interessante. Quando os ciganos chegaram viviam exatamente nas mesmas condições em que vivem os africanos.
É esse o seu cinema.
Sim, adoro lá viver e gosto desse universo, dessas pessoas com quem tenho feito estes filmes. Quando vou ver um filme, há muitas coisas que observo. Mas uma das que mais me motiva é ver alguém que nunca vi antes fazer algo no ecrã. E há o potencial de explorar o cinema nessa região. É uma cidade pequena e já lá fiz dois filmes, por isso confiam em mim e estão disponíveis para eu explorar vidas e universos com a devida honestidade.
Depreendo que não esteja tentado em fazer algo nos Estados Unidos.
Nesto momento, não. Não me interessa nada ir para os EUA fazer um filme sobre um comic book (risos) Mas nunca se sabe. Há muitas coisas interessantes a acontecer na América no cinema, mas não é aí que estou agora.
Outro elemento vital no seu filme é a música. Até que ponto é também uma influência dessa comunidade?
Essa é a música que eu ouço ali. Para mim, a música é uma forma de conhecer as pessoas. Se gostamos da mesma música já temos bastante em comum. É uma linguagem universal. Toda a música que se ouvem em A Ciambra é a música que estão sempre a ouvir.