Será legítimo assumir que por mérito próprio, Alma Pöysti (1981) e Jussi Vatanen (1978), atores com uma larga carreira em televisão, mas igualmente em cinema, passam agora a fazer também parte da família kaurismakiana. Apesar da atitude estoica e irrepreensível deste par, aguçou-nos a curiosidade do elemento canino, adotado por Aki durante uma das recentes estadias na sua casa em Portugal. Alma ri-se porque “na verdade, o nome verdadeiro da cadela é… Alma! Foi um cão que Aki trouxe de Portugal há uns anos. E esta é a sua estreia como atriz”, revela. E não deixa de referir a título de elogio, como se fosse uma colega de trabalho: “por sinal, ela tem imenso talento e uma enorme sensação de ritmo.“ Ficámos igualmente a saber por Jussi que a rodagem decorreu em “pouco mais de 20 dias,” apesar da queixa jocosa de que “há seis meses que não fazemos nada do que falar sobre ele. É incrível.”
Insider – De que forma o senhor Kaurismaki vos preparou para estes papéis de solidão?
Alma – Não sei se preparou… (risos) Era algo que já estava no guião. O resto foi a confiança. Pois ele confiou que poderíamos dar luz a estas personagens. Foi como uma espécie de diálogos silenciosos, em que tentávamos perceber de onde elas viriam e de que forma as haveríamos de interpretar. Nesse sentido, conferir ao ator o tempo de invocar essa força para espelhar a sua solidão.
Jussi – É fácil acreditar no Aki. Ele conhece muito bem a sua arte. E conhece melhor do que ninguém o ‘género kaurismaki’. Portanto, se não confiarmos nele, em quem iremos confiar? Para mim, o mais fantástico foi o facto de ele não usar um monitor para ver o que está a ser filmado. Apenas nos observava junto à câmara. Ele que trabalha com o diretor de fotografia Timo Salminen há muito tempo, em quase todos os filmes dele. Portanto acho que eles já pensam as mesmas coisas. Não se escondia atrás do monitor. É preciso der coragem para viver essas cenas connosco.”
Insider – Ele é muito exigente no sentido de pedir a perfeição nas interpretações?
Alma – É um tipo adorável que cria uma atmosfera incrível em seu redor. Quando trabalhamos com o Aki Kaurismaki todos nós queremos dar o melhor de nós próprios. Tudo está relacionado com os detalhes com o ritmo, para que tudo possa correr bem. Sabemos qual é a sua visão, por isso percebemos onde deve estar cada elemento no plano. Cada um de nós faz a sua parte o melhor que sabe para completar o conjunto. Fiquei entusiasmada em tentar perceber como ‘menos’ se pode transformar em ‘mais’. É como ter confiança no silêncio. E há muitos silêncios neste filme. Não só nas personagens, mas também entre elas. As palavras estão lá, porque são escolhidas para ali estarem. Mas não há nada de especial nelas.
Jussi – Ele leva muito a sério o seu trabalho. O filme anterior a este saiu há seis anos. De certa forma esta é também uma viagem dele. Só temos de estar agradecidos de ter a oportunidade de partilhar com ela a mesma viagem. Aki é um autor. Ele filma como se pintasse um quadro. Talvez isso tenha tirado parte da pressão do que eu tinha de fazer. Fazia apenas o meu trabalho.
Insider – Esta é uma história de amor em tempo de guerra e após um longo período de confinamento. De que forma se relacionam com essa necessidade de amor neste tempo?
Jussi – Todos nós precisamos de amor. Tal como de humor. Gosto do facto de durante estes 81 minutos em que estamos a ver o filme – um tempo bastante curto, na verdade – temos a sensação de que estamos num local seguro. Especialmente durante estes tempos de guerra.
Alma – Acho que o AKi sugere o cuidado e a empatia como uma forma de contrariar o cinismo e a exploração que existe em todo o lado. Por exemplo, as colegas de trabalho da Ansa são bastante unidas e preocupam-se umas com as outras. E, de repente, mostram-se com muito poder. De certa forma, isso é também um ato de amor. Mas as comédias românticas de Aki Kaurismaki têm mais sal do que açúcar. Talvez seja por isso que acreditamos nelas, naquela honestidade brutal, mas na qual se pode confiar. Nesse sentido, é um filme bastante romântico. Porque as pessoas necessitam de acreditar no amor.