Emma Thompson recupera o perfil austero da “babá” para cuidar das crianças irrequietas. E retoma a autoria do guião desta história original de Christianna Brand. Conversámos com esta versátil actriz britânica.
O que é que a atraiu nesta personagem da Nanny McPhee para a levar a escrever um novo filme?
Eu adoro a personagem, pois para mim personifica a essência da sabedoria. Ela tem paciência, é judiciosa, tem sentido de humor. Acho que a sabedoria não poderia existir sem sentido de humor.
Quais foram as suas influências para esta nova história?
Sabe, o meu pai teve uma enorme influência em mim e também escrevia para crianças. Aliás, foi ele que me entusiasmou e mostrou o caminho para que pudesse também eu um dia escrever para crianças. A verdade é que eu costumava ver imensos westerns com ele. E percebi entretanto que as histórias da Nanny McPhee têm o mesmo estilo dos westerns. A Nanny McPhee é a estranha que vem de fora, resolve os problema com métodos poucos ortodoxos e regressa sozinha. Ao por do sol, ou não (risos). Foi então que decidi ver todos os westerns do Sergio Leone, Cint Eastwood e John Ford para ver se roubava algumas ideias, caso venha a fazer-se um terceiro filme. Se este fizer dinheiro suficiente (Bate na madeira)… Isto apesar deste ter sido feito com o mesmo orçamento que o anterior. Mas com mais efeitos especiais.
Sim, com porcos dançantes e voadores…
(risos) Muito bons actores os porquinhos, tenho de dizer. E não o burro digital do filme anterior que não trabalhava bem. Aqui os porcos eram tão bons actores que cheguei a pensar despedir alguns actores e ficar apenas com estes porquinhos vestidos de personagens…. (risos)
Tenho curiosidade de saber como era a Emma em criança. Era do tipo rebelde? Também precisava de uma “nanny”?
Não, nem por isso… (risos). Eu era até uma menina bastante bem comportada. Por várias razões. Teria de perguntar à minha mãe, mas ela até costuma dizer que a minha educação foi como ser passada por uma betoneira. Eu não me lembro de ser assim, mas é verdade que tinha muita energia. No entanto, repare eu nasci em 1959, apenas alguns anos depois da guerra, numa altura de grande austeridade. Nessa altura Londres era bem diferente. Tinha sido educada a levantar-me sempre que entrava alguma na sala. Era uma educação bastante rígida. O meu pai era uma pessoa muito doente e eu deveria ter uns sete anos quando o meu pai teve o primeiro ataque cardíaco. Talvez por isso, eu também não tivesse nada com que me revoltar. Eu só me revoltei depois de ele morrer quando já tinha 20 anos.
Como desenvolveu a apetência para a representação? Talvez por os seus pais também serem actores…
Sim, de certa maneira. Toda a minha família tem actores. O meu pai, por exemplo, foi um actor e escritor e só depois se tornou realizador. A minha mãe é actriz, a minha irmã também, os meus primos, os meus padrinhos era encenadores. Já vê, toda a minha família tinha raízes à representação.
Sentiu-se de alguma forma enclausurada nesse meio?
Não, de modo nenhum. Mas também não senti que queria ser actriz até aos meus 27 anos. Antes queria ser comediante, pois descobrira a comédia na universidade. Era isso que eu fazia na vida cinco anos depois de sair na universidade. Fazia e escrevia ‘sketches’ de comédia como modo de vida. Era aí que eu via a minha função, não propriamente como actriz convencional.
A Susanna (White, a realizadora) disse-nos que a Emma era uma pessoa que se interessava por tudo aquilo que tinha a ver com o filme. Será que a realização é também algo que está nos seus planos?
Não (risos). É que a realização é um processo tão penoso e longo que não me dá tempo para fazer mais nada. Têm-me aliás feito essa pergunta ao longo dos anos mas a minha resposta é sempre a mesma: “Se me disserem como poderei ser uma mãe afectiva e realizar um filme ao mesmo tempo, então eu poderei considerá-lo”. É nessa altura que ficam a olhar para mim resignados, como que a dizer “pois, isso não é possível”. Porque sabem que não é possível ser um pai presente. Digamos que seria assim: “Bom, vou tentar ser a melhor mãe, mas vejo-os daqui a um ano, ok?”.
Acha que os actores crianças são mais fáceis de trabalhar?
Não podemos generalizar, pois há actores jovens que são muito fáceis de trabalhar e outros mais velhos são complicados independentemente da idade. Mas com crianças é sempre fácil de trabalhar, embora necessitem de muita energia. São óptimos, mas temos de os estimular para não perderem a espontaneidade.
Se uma verdadeira Nanny McPhee se candidatasse ao um emprego para tratar das suas crianças, contratava-a?
Claro. Talvez ficassem um pouco intrigada, porque também acho que um pouco de anarquia é salutar para todos…
Teve também já alguma sensação de experimentar uma situação de anarquia incontrolável em casa, como a senhora Green (Maggie Gyllenhaal)?
Para ser sincera, a tarefa de mãe é tão exigente em qualquer circunstância. E tenho um filho fruto do meu ventre e um outro adoptado. Mas educar Gaia (nascida em 1999 fruto da relação com o actor Greg Wise,) quando estávamos ambos presentes, com dinheiro, tempo e saúde para ela. Mesmo assim havia ocasiões em que ficava lavada em lágrimas. Isto porque educar qualquer criança é uma tarefa muito complicada. Não há manuais e ele não vêm como livros de instruções. Deveria haver curso de educação para pais. O que eu aprendi a educar a Gaia foi ouvi-la com calma. Isso é muito importante. Não sei como é em Portugal.
Acha que a educação das mães é mais importante do que a educação dos pais?
Não necessariamente. Dar á luz já é algo demasiado exigente, com um pé na morte e outro na vida, como dizem os africanos. O meu marido trem um hábito nigeriano de dar um presente à mão no aniversário da filha, pois a mortalidade em África é devastadora. É que depois das mães darem à luz ficam num estado terrível. E mais uma vez isso não é muito comentado. A depressão pós-Natal é muito comum e não é muito atendida. Para além disso, temos o estado emocional e mental, pois estamos divididos em duas pessoas depois de dar à Luz. Para mim, foi algo que me marcou. Sinto que já não sou a mesma pessoa depois de dar à luz. Dito isto, acho que há muito para discutir sobre a maternidade. E acho que há muito para discutir sobre o assunto. E há muitas mães, mas também pais, que precisam de ajuda.
É verdade que está já a escrever um novo guião para ‘My Fair Lady’?
Sim, comecei a escrever há dois anos. A Sony queria fazer um ‘remake’ que fosse menos teatral e mais emotivo, com a Londres real e não cenários. Eu regressei ai original de Bernard Shaw e li muitas cartas para as actrizes, como Sarah Berhard. Desenvolvi o Higgings pelas cartas de Shaw.
Como se sente ao saber que tem o apreço de muitas crianças em todo o mundo?
Eu adoro crianças. Gosto mesmo. Respeito-as muito, pois é muito difícil ser uma criança hoje em dia. Lembro-me como foi difícil para mim. O reconhecimento das crianças é muito recente. Acho que não são ainda reconhecidos como deveriam ser. Não tê o mesmo espaço que deveriam ter. Viajo por todo o mundo o e vejo isso em todo o lado. Por isso este filme é mesmo feito para eles.
Tem um bronzeado glorioso. Não é da solarenga Londres…
Não, estive no México no mar de Cortez. Foi glorioso.
Tindy, a filha africana de Emma
Em 2003, o casal decidiu adoptar uma menina refugiada do Ruanda cujos pais haviam morrido durante o genocídio. Aos 16 anos, Tindyebwa Agaba ganhava assim uma nova vida e estabilidade, sobretudo depois dos novos pais resistirem aos pedidos de sua deportação para Ruanda.
PAULO PORTUGAL, LONDRES
(entrevista parcialmente publicada no Correio da Manhã)