Aterra esta semana nas nossas salas um filme que é uma espécie de tudo-em-um em matéria de reprodução na tela de todo o tipo de catástrofe natural. Por isso mesmo, com a vontade de elevar a fasquia dos filmes baseados em efeitos CGI para níveis ainda mais estratosféricos. Assim parece ser a premissa de Geostorm – Ameaça Global, de Dean Devlin, o produtor e argumentista tornado realizador uma ligação próxima a Roland Emmerich, em O Dia da Independência, Godzilla e Stargate. Eis então que após os longos reshoots, devidamente supervisionados por Jerry Bruckheimer, esta Ameaça Global paira finalmente sobre nós destinada a fazer um estardalhaço de estragos digitais.
Ainda assim, não deixa de ser algo paradoxal a estreia deste blockbuster da Warner numa semana em que as capas da imprensa nacional ainda fumegam pela tragédia que transformou o país num verdadeiro disaster movie. Aliás, se pensarmos bem, os desastres naturais têm estado na ordem do dia, com variantes de incêndios, tempestades tropicais, inundações ou secas brutais. É a vez dos efeitos especiais se tornarem demasiado reais. Todos nos lembramos ainda das reportagens e dos infindáveis relatos da catástrofe. De resto, numa altura em que as alterações climáticas fazem tão parte do presente, estes cataclismos mais radicais que surgem no cinema quase se podem assumir como uma espécie de super-vilões, já que, pelo menos em escala, quase nada os supera. Enfim, that’s entertainment.
É claro que se percebe a ideia de combinar os mais ousados efeitos visuais para criar uma ficção ultra espetacular, com arranha-céus a cair como castelos de cartas ou bíblicos tsunamis, embora sempre com a rima do perigo eminente centrada em algumas personagens em que sabemos de antemão que irão ser salvas in extremis. Se bem que tais efeitos onde se gasta a parte de leão dos orçamentos de sete ou oito dígitos podem correr o risco de ser algo banalizados em públicos cada vez mais experientes e exigentes. Por isso mesmo o espaço a dar à estrutura narrativa deverá de ser suficientemente robusto para justificar todo o espetáculo visual.
Nesse sentido, a ideia de conjugar tudo o que já se fez nesse domínio numa única história é, no mínimo, um conceito ousado. Talvez nem tanto num futuro onde as flutuações climáticas acabam por ser controladas pela mão do homem, ou por estações espaciais que conseguem servir de maestros do tempo e do espaço, como se tratassem de um deus mecânico. É o caso de Dutch Boy, uma estação orbital cujo batismo terá sido inspirado numa história infantil sobre um garoto que coloca o dedo numa parede de água para impedir a sua terra de ser inundada.
É também aqui que entra em cena Gerard Butler como o técnico irascível, no entanto o único perito capaz de chegar a tempo de impedir que os satélites encarregues de manobrar o tempo acabem por provocar a tal chuva de catástrofes ou ameaça global. Sim, ele é o Dutch Boy. Isto numa altura em que a Sala Oval está ocupada por um Presidente Democrata hispânico (Andy Garcia) com o poder de gerir essa imensa máquina de gerir o tempo, e a seu lado com um veterano (Ed Harris) que a certa altura deixa mesmo escapar um estranho American great again!
Para termos uma ideia do rigor dos fenómenos artificiais vividos no filme, uma patrulha militar no deserto com uma canícula de 50º apercebe-se de um pedaço de gelo na areia e logo a seguir um grupo de soldados afegãos totalmente transformados em bonecos de gelo, ou então, numa outra cena, uma tempestade com blocos de gelo destrói parcialmente uma cidade. Há ainda um outro glitch do satélite provoca um sobreaquecimento do solo que arrasa a metrópole de Hong Kong, com os tais edifícios em castelo de cartas e uma versão de carrinho Smart a repetir situações in extremis.
É claro que este homem tem uma família, pelo menos uma filha de treze anos com mais maturidade do que ele e um irmão (Jim Sturgess), responsável pela estação, com um passado de alegria, mas que se viu forçado a despedi-lo por má conduta, mas que terá de o readmitir para cumprir essa missão de salvação global. No meio desta narrativa mirabolante haverá ainda a necessidade de raptar o Presidente para possibilitar uma missão dentro da missão, em conivência com uma agente governamental, interpretada por Abbie Cornish, e Jim Sturgess.
Em Geostorm – Ameaça Global passam-se em revista uma coleção de efeitos especiais que de uma forma ou outra vimos em filmes mais ou menos recentes, como San Andreas, O Dia Depois de Amanhã ou O Dia da Independência, apesar de se detetar, aqui e ali, elementos de tensão inspirados em 2001, Odisseia no Espaço ou Gravidade.
Aqui está um filme que brinca com a manipulação do ambiente, isto em plena era de descrédito ambiental pela Administração Trump. No entanto, uma ideia que o atual inquilino da Cada Branca nem haveria de enjeitar. Só que esta medida de ficção acaba por ser, em parte, superada pela escalada das catástrofes naturais dos tempos que correm, com efeitos demasiadamente reais, dificilmente superados pelos óculos 3D ou pelo ecrã IMAX.
Este pode muito bem ser o Godzilla dos Filmes catástrofe, já que pretende combinar os diversos elementos mastodônticos que temos visto nos filmes do género mais recentes. Uma narrativa sobre o controlo das alterações climáticas até poderia ter força, se bem que o resultado não chega para convencer. Até porque recentemente a realidade tem sido demasiado pródiga em mostrar efeitos demasiado reais.