A Forma da Água, do mexicano “emigrante” Guillermo del Toro, venceu sem surpresas os prémios mais importantes – Melhor Filme e Realização – numa noite previsível e maçadora, aliada à falta de uma mensagem mais clara sobre o gritante movimento igualitário. Mas ofereceu-se um jet ski para o discurso mais curto…
Quando então o repetente Warren Beatty e Faye Dunnaway subiram ao palco para emendar o desastre do ano passado, e confirmaram mesmo que o vencedor do Óscar de Melhor Filme era mesmo A Forma da Àgua, caíram também por terra as possibilidades de distinção de filmes melhores, como Três Cartazes a Beira da Estrada, seguramente o grande perdedor da noite, com apenas dois Óscares, Chama-me Pelo Teu Nome ou Foge!, apenas com o Óscar de Guião adaptado. A Linha Invisível, de Paul Thomas Anderson ficou-se pelo prémio decorativo, e inevitável, do guarda-roupa. Surpresas, nicles. Ou apenas Jordan Peele a ‘roubar’ o guião original ao Martin McDonagh.
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Assim decorreu a cerimónia dos 90 anos da estatueta do homem sisudo. Então no capítulo da interpretação o tédio foi demasiado, com o selo há muito decidido. O que nos leva a pensar na forma conservadora e carreirista como decidem os membros da Academia – e até, se quisermos, o setor mais da imprensa mais próximo da indústria e que acaba por ser responsável por um hype que quase sempre resulta em preferências mais ou menos consensuais, ainda que nem sempre ajustadas. Mas isso é outra conversa.
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Para a história fica então A Forma da Água, um filme que cedo se posicionou como favorito aos Óscares e que não foi abalado pelas acusações de plágio, a tal variante do Monstro da Lagoa Negra, um filme série muito B de ficção científica, que iniciou a corrida aos mais importantes prémios do cinema assim que venceu o Leão de Ouro, em setembro passado, no festival de Veneza, iniciando depois uma longa lista de prémios da indústria.
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Se quanto ao melhor filme ainda se poderiam alimentar algumas expetativas, já que del Toro concorria com mais oito candidatos, as categorias de interpretação limitaram-se à confirmação do que há muito era dado como seguro, em mais uma demonstração de conservadorismo académico. Frances McDormand e Sam Rockwell venceram a interpretação feminina e melhor secundário, confirmando a razão pela qual Três Cartazes à Beira da Estrada foi um dos fenómenos da temporada, com treze nomeações, embora ficando-se por quatro prémios, em grande parte devido ao guião espevitado de Martin McDonagh. Ele que haveria de perder o Óscar de Melhor Guião Original para Jordan Peele, naquela que foi a única surpresa da noite, mas também a meia injustiça. E só metade porque também na incrível história de Peele que assenta parte do sucesso de Foge!
O mesmo sucedeu com a mera confirmação de Gary Oldman, pela composição absorvente de Churchill, em A Horas Mais Negra, na sua longa carreira distinguida em que obteve o primeiro prémio na segunda nomeação, tal como a avassaladora prestação de Alysson Janney em Eu, Tonya, outro dos filmes injustiçados, desde logo pela ausência da nomeação para Margot Robbie, talvez na prestação mais completa das visadas.
A noite dos Óscares deu ainda três prémios técnicos a Dunkirk, no relato épico da retirada das tropas britânicas das praias da Normandia por Chris Nolan, mesmo que num registo não nos chegou a convencer. E tivemos a consagração de Uma Mulher Fantástica, do chileno Sebastian Lelio, o tal filme sobre uma mulher transexual – a mulher fantástica é mesmo Daniela Vega – na categoria de Melhor Filme Estrangeiro. A Pixar soma e segue, não deixando espaço à concorrência, com Coco a somar o tema musical à melhor animação.
De fora ficaram, com alguma injustiça, Lady Bird e The Post, sem conquistar qualquer prémio, ou mesmo Mudbound.
Ficou assim o Palmarés:
Melhor Filme: A Forma da Água
Realização: Guillermo del Toro, A Forma da Água
Ator: Gary Oldman, A Hora Mais Negra
Atriz: Frances McDormand, Três Cartazes a Beira da Estrada
Atriz Secundária: Allison Janney, Eu, Tonya
Ator Secundário: Sam Rockwell, Três Cartazes a Beira da Estrada
Fotografia: Roger Deakins, Blade Runner 2049
Argumento original: Jordan Peele, Foge!
Argumento Adaptado: James Ivory, Chama-me Pelo Teu Nome
Montagem: Lee Smith, Dunkirk
Banda sonora original: Alexandre Desplat, A Forma da Água
Melhor Filme Estrangeiro: Uma Mulher Fantástica, Chile
Melhor Documentário: Icarus, de Bryan Fogel e Dan Cogan
Design de produção: A Forma da Água, Paul Denham Austerberry, Shane Vieau e Jeff Melvin
Guarda-roupa: Mark Bridges, A Linha Fantasma
Montagem de som: Richard King e Alex Gibson, Dunkirk
Mistura de som: Mark Weingarten, Gregg Landaker e Gary A. Rizzo, Dunkirk
Efeitos Visuais: John Nelson, Gerd Nefzer, Paul Lambert e Richard R. Hoover, Blade Runner 2049
Maquilhagem e guarda-roupa: Kazuhiro Tsuji, David Malinowski e Lucy Sibbick, A Hora Mais Negra
Banda sonora (tema original): Remember Me, Coco
Melhor Documentário – curta: Heaven Is a Traffic Jam on the 405, de Frank Stiefel
Melhor Animação: Coco
Melhor curta: The Silent Child, Chris Overton e Rachel Shenton
Melhor curta animação: Dear Basketball, de Glen Keane e Kobe Bryant