Paulo Portugal, em Berlim
Diante da força das armas e da opressão, o cinema tem sido, frequentemente, a voz que mais pugna pelas mais diversas formas de liberdade. Como se a determinação e resistência ucraniana à invasão pelas forças russas, mas também a força do protesto no Irão, recebessem a devida expressão nos filmes programados na Berlinale e nas múltiplas iniciativas de apoio.
Tudo começa no dia 18, com um painel de discussão sessão subordinada ao tema “O papel do Cinema e das Artes na Revolução Iraniana”, prosseguindo depois, no dia 24, com a evocação do aniversário da ocupação russa na Ucrânia. No que diz respeito à programação do festival, praticamente em todas as secções da 73ª edição da Berlinale (com a excepção da competição oficial) poderão ser vistas produções e co-produções ucranianas ou aflorando o tema da invasão do seu território.
É Sean Penn a filmar Volodymyr Zelensky, em Superpower, na Berlinale Special, o tal filme que se tornou “num projecto cuja realidade forçou a transformar-se em algo menos controlável, mas mais significante”. Ou a visão do cineasta ucraniano Vitaly Mansky e Yevhen Titarenko em Eastern Front, a concurso na secção Encounters, relatando as múltiplas experiências no batalhão médico, formado em 2014, e no qual se voluntariou o ano passado. Também no Fórum a realidade da guerra na Europa é captada pela câmara de Piotr Pawlus e Tomasz Wolski documentado a experiência nos últimos meses na Ucrânia e reproduzida no documentário de origem polaca W Ukrainie.
Uma abordagem diferente é aquela que promove a co-produção Iron Butterflies, a dirigida pelo ucraniano Roman Liuby, exibir na secção alternativa Panorama, seguindo a investigação sobre o abate do avião da Malásia em solo ucraniano em 2014, expondo o mecanismo do sistema de guerra russo. Ainda na mesma secção, descobre-se igualmente Ty mene lubysh?, cuja tradução será ‘amas-me?’. É esta a interrogação de Tonia Noyabrova, besta co-produção da Ucrânia com a Suécia, reflectindo a desagregação de um país e uma família vista pelo olhar de uma jovem de 17 anos. Atenção também conferida ao tema a partir das curtas em competição, com a proposta It’s a Date, de Nadia Parfan, em que um único plano subjectivo de cinco minutos dentro e um carro que avança a toda a velocidade, o ano passado na capital Kiev, captando o estado de emergência vivida.
Por fim, a secção Generation, dedicada a propostas de juventude, apresenta dois filmes: We Will Not Fade Away, de Alisa Kovalenko, expondo o retrato de um grupo de jovens na região do Donbass à procura de um escape da realidade, ou os jogos a que se dedicam adolescentes ucranianos num campo de refugiados alemão, em Waking Up In Silence, de Mila Zhluktenko e Daniel Asadi Faezi.
Finalmente, esta longa lista de propostas de um cinema de urgência, contempla ainda a escolha de Sergei Loznitsa no clássico lituano de 1970, The Beauty, assinado por Arūnas Zebriūnas, desafiando a vida social soviética, apresentado na secção Retrospectiva.
Acompanhando a revolução no Irão
O cinema serve ainda de espelho à realidade iraniano em mais de uma dezena de filmes nas diferentes secções da Berlinale. Deixamos aqui uma breve descrição desse programa, de certa forma, a servir de complemento ao ciclo que a Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema dedicou ele mês ao cinema iraniano antes da revolução islâmica de 1979. Algo que é acompanhado pelas recentes estreias de filmes iranianos no nosso país, de que No Bears, de Jafar Panahi (um cineasta várias vezes galardoado em Berlim) será o mais recente exemplo do cinema em língua frasi.
Encounters
Mon pire ennemi, de Mehran Tamadon (França/Suiça)
Panorama
La Sirène, de Sepideh Farsi
France / Germany / Luxembourg / Belgium
And, Towards Happy Alleys, de Dr Sreemoyee Singh (India)
Motståndaren, de Milad Alami (Suécia)
Forum
Where God Is Not, de Mehran Tamadon (França/Suíça)
Forum Expanded
Scenes of Extraction, de Sanaz Sohrabi (Canadá)
Generation
Dreams’ Gate, de Negin Ahmadi (Irão/ Noruega/França)
And Me, I’m Dancing Too, Mohammad Valizadegan (Alemaha/Republia Checa/Irão)
Perspektive Deutsches Kino
Seven Winters in Tehran, de Steffi Niederzoll (Alemanha/França).