Terça-feira, Outubro 8, 2024
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Denis Côté: “Higiene social pode ser a limpeza da nossa imagem na vida e nas redes sociais”

Denis Côté traz um filme novo ao festival de Berlim em cada três anos. Normalmente, na seleção oficial para Urso de Ouro, embora este ano o mais experimental Hygiène Sociale se enquadre melhor na secção Encounters. Aliás, este é um excelente exemplo do cinema em tempos de pandemia, sem recurso a efeitos, meios financeiros, fantasias, maquilhagem ou complicados movimentos de câmara. Mas Côté diz que não foi um filme provocado pelo covid.

“É claro que estava à procura de ironia e distância”, exclama Côté do outro lado do ecrã na nossa entrevista via Zoom, algures em Quebeque. “Nem vale a pena pensar no covid, porque poderia ter imaginado o filme a passar-se num quarto. Poderiam ser os mesmos diálogos, só que menos divertidos”. Denis fala rápido, pleno de energia e entusiasmo, de forma quase hiperactiva. Um pouco como o seu cinema. Aliás, acrescenta que o filme foi escrito há cinco anos atrás num quarto de airbnb, em Sarajevo, e que já na altura tinha o mesmo título e personagens a declamarem uns para os outros no meio do campo.

“Quis fazer um filme intemporal, brincando com tempo e espaço, em que as personagens são mais protótipos os arquétipos. Não têm uma personalidade muito formada. O que fica no final é a palavra, o discurso.” Algo que é para ser levado também com algum humor. Nesse sentido, cita a influência do sueco Roy Anderson (de quem vimos recentemente Da Eternidade), por se tratarem de nobody’s in the middle of nowhere. E acrescente até um pedido de ajuda. “Ainda nem sei bem como falar deste filme, acho que preciso da vossa ajuda”, diz a sorrir.

Hygiène Sociale desenrola-se ao longo de seis capítulos, cada um deles filmado num único plano sem qualquer indício de montagem. Por vezes mesmo sem encararem o actor com quem contracenam. Um pouco à maneira de Jean-Marie Straub – só que sublinhado por um lado mais dandy, como o próprio defende.

O protagonista é um jovem chamado Antonin (que o realizador garante nada ter a ver com Antonin Artaud), um assumido ladrão e poeta diletante que recebe acusações de várias mulheres com quem fala de forma distante. A irmã, a esposa, a namorada, uma assistente do ministério e um conhecido casual. Naturalmente, lança ao espectador o desafio por um ritmo demasiado pausado dos diálogos e do movimento estático.

Alguns deles aparecem em trajes antigos, outros em roupas modernas – lembrando assim que o tempo voa, a moda muda e uma pessoa permanece inalterada nos seus desejos, medos e possibilidades. Essa inflexibilidade e a constância é enfatizada pelas posições estáticas das personagens que se tornam duplamente inconvenientes para a comunicação.

E o que poderá estar na ideia de higiene social? Côté sugere: “pode ser a limpeza da alma, da nossa imagem. Não são na vida real, mas também nas redes sociais. Eu sei que pensei um pouco nisso quando estava a escrever o texto. Mas imagino como todos os dias procuramos compreender como controlamos tudo o que aparece sobre nós no Facebook ou nas outras redes sociais. Apesar de estarmos constantemente a postar elementos pessoais. Por isso, acho que acabamos por adorar pessoas ou odiá-las por estarem das redes sociais. Por isso pergunto como controlamos a nossa imagem social? Acho que é isso que fazem, tentando encontrar um equilíbrio. O título é apenas fancy“.

Perguntamos-lhe como se prepara para o gesto de filmar, já que se mantém bastante activo. Ele concorda “Eu faço pelo menos um filme por ano”. Ou seja, será portanto um realizador prolífico. Cita, por exemplo, o caso de Hong Sangsoo (que também exibe em Berlim o seu novo filme Introduction) e que pode fazer “dois ou três filmes num ano”. No seu caso, admite que não seria capaz de fazer apenas um filme a cada cinco anos. “Faço filmes, como se constroem casas. Tenho 47 anos e posso dizer que o meu 13º filme foi feito em quatro dias e não custou nada. Posso dizer isto porque uso o cinema não para alcançar algo, mas para me libertar. E para me sentir bem comigo próprio. Não para ganhar prémios. O que gosto é de tentar coisas diferentes. Não faço filmes para mudar o mundo.”

Sente-se que Denis Côté necessita estereótipos. Talvez por isso os seus filmes sejam muito solicitados por festivais, como Locarno, onde levou cinco filmes. O último foi em 2017, com Ta peau si Lisse, uma aproximação à vida de body builders, embora em registo pausado de pura observação. Bem como em Berlim. Curiosamente, foi também em Berlim, precisamente o ano passado, em que o romeno Christie Puiu trouxe (e venceu) na mesma secção, a sua pièce de résistence com o filme Malmkrog. Curiosamente, um filme que assenta em longos planos sequência, e uma divisão em capítulos, em que a catarse é alcançada por meio de longas conversas sobre o destino do mundo.

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