Sábado, Abril 27, 2024
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Barbie: de Oz para LA à procura de uma vagina

Imagina-se que Greta Gerwig terá tido uma epifania inspiradora para fazer Barbie. Não é que seja necessária uma imaginação prodigiosa, mas é possível imaginá-la a receber uma luz depois de estar com alguma menina devidamente acompanhada pela sua boneca. Fará todo o sentido, sobretudo se procurasse inspiração para novo projeto. E pistas não faltam para dar vida à boneca mítica da Mattel. Desde logo, na rábula que o filme de animação Toy Story lhes dedica. Daí à atual euforia feminista é um momento tão rápido quanto proferir a palavra ‘Ken’.

Imaginamos até a atriz realizadora num pitch diante dos executivos da Warner, expondo uma narrativa que hibridiza O Feiticeiro de Oz, o musical de Victor Fleming, de 1939, sugerindo a viagem de volta de uma espécie de Oz-Barbieland, em que uma Barbie-Dorothy trota alegremente ao longo de ‘pink brick road’ com destino a uma realidade feita de várias matizes de cinzentos – desta vez não no Kansas, mas nas matizes de todas as cores na cosmopolita Los Angeles. Tudo começará com a originalíssima ideia kubrickiana no início de 2001 e o seu famosíssimo raccord. Uma ideia estafada? Não vamos tão longe. Será que a poderemos censurar? Nhee… Como se vê, não só a ideia tem pernas para andar, como permitiu até uma inesperada hibridização com o filme da Universal, Oppenheimer, de Chris Nolan, gerar essa figura conhecida por ‘Barbenheimer’. Como se sabe, a jogada seria coroada de sucesso. Desde logo, porque alavancada por alguns ‘influencers’ (olá Paul Schrader!) que criaram o devido buzz capaz de compensar os efeitos mais imediatos da greve no meio cinematográfico. Além da proeza de gerar um astronómico resultado de bilheteira: um recorde pós-pandemia, além de reivindicar o quarto maior resultado de sempre. De sempre! É obra, portanto.

O mundo de Oz… perdão Barbieland.

Mas voltemos à stereotipical Barbie e à prestação de Margot Robbie, já no limite dos seus 33 anos para espelhar esse figurino de perfeição do produto da Mattel. Ainda assim, o suficiente para quem delira com estereótipos – tando delas como deles -, e um desejo de pertença orgulhosamente traduzido na investidura de um dress code rosinha para ir ao nimas. Mais à vontade a própria Greta, como a weird Barbie, numa espécie de réplica de Pris, a andróide replicant acrobata, interpretada por Daryl Hannah, em Blade Runner. É neste clima que tudo se reduz ao denominador comum do mero produto comercial, devidamente estereotipado, e embalado, piscando o olho aqui e ali, ao que já sabemos que vamos ver, bem como ao riso forçado dos espetáculos televisivos. Em suma, Barbie, o filme, obedece a um comportamento a que voluntariamente aderimos. A saber, o eterno confronto masculino-feminino, à vingança feminina sobre o poder do patriarcado (a expressão mais ouvida no filme).

E assim voltamos a Oz, ou melhor, a Barbieland. Só que Barbie não necessita de um cérebro, como o homem de lata, um coração, como o espantalho, ou de coragem, como o leão. Pois, a Barbie falta-lhe apenas uma… vagina!! Pois claro. Tal como um pénis a Ken. Ou seja, algo que lhes devolva uma realidade mais humana. Daí a deriva encetada até a Venice Beach, em LA. Nada a apontar. Justificada portanto a classificação para maiores de 12 anos. É isso, não é? 12 anos. Pois.

Longe vão os tempos em que miss Gerwig era uma espécie de guru do movimento ‘mumblecore’, vulgo sub-género cinematográfico alternativo, caracterizado pelo baixíssimo orçamento e, precisamente, por uma oposição feroz aos… clichés de Hollywood. Uma vez mais, nada a dizer. Sobretudo quando os milhões falam mais alto. Podemos até fazer a réplica com a notícia do futebolista francês Mbappé, aos 24 anos a viver o dilema de ponderar um contrato das arábias de 700 milhões para jogar num clube de jogadores milionários e pré-reformados. Ou ficar onde estava. Acabou por não aceitar. Também não o censuramos. Tal como não censuramos Barbie à procura de uma vagina. Ou será que é uma Barbie à procura da sua… Greta?

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